Este texto condensa a memória de um caminho percorrido, comporta o desejo de um futuro e oferece-se como convite a todos os que o queiram partilhar.
O Metanoia – Movimento Católico de Profissionais constitui-se como espaço e tempo de encontro, acolhendo pessoas, crentes ou não, nas mais variadas circunstâncias de vida. O encontro acontece a partir do que cada um vive e transporta, procurando não separar interioridade e exterioridade, reflexão e vivência, princípios e acção, espiritualidade e cidadania, opções pessoais e futuro das nossas sociedades.
Resistir a tais separações é dar lugar a uma atitude participativa – "sou parte do que se cruza na minha vida "— e à consciência da presença do outro como dom e como exigência.
Precisamos e gostamos do debate, de questionar a ordem do mundo que vivemos e que fazemos, de interrogar a nossa fé e a nossa vida e de as celebrar em conjunto, festejando o encontro dos que procuram Jesus ressuscitado.
Procuramos reflectir sobre toda a realidade, sem programas de acção social, política ou eclesial, muito menos orientações de índole profissional; somos parte dessa realidade, dela partindo e a ela voltando, como esforço de compreensão aprofundada e abertura a empenhamento consequente.
Pretendemos criar e manter espaços de liberdade, de corresponsabilidade, de reflexão e partilha de vida, de conversão, de aprendizagem uns com os outros. Espaços onde cada um se sinta reconhecido, no respeito pela sua individualidade e autonomia.
Assumindo a nossa condição de homens e mulheres, filhos de Deus, queremos aprender com Jesus o que é tornar a vida bem-aventurada – uma aventura de bem. Uma aventura em simplicidade, pureza, mansidão de coração, dispondo-nos a confiar, a persistir e a valorizar as potencialidades dos outros; uma aventura em misericórdia, em compaixão e ternura que aceita o mistério inscrito na vida, naquilo que nós próprios transportamos, incluindo as nossas imperfeições; uma aventura em justiça, construindo um mundo com um horizonte de inclusão do estranho e do aflito; uma aventura em paz, a paz de Jesus que se centra no amor (a não morte), desafiando-nos a inventar novas formas de relacionamento que não fujam nem ao desejo nem ao conflito; uma aventura em despojamento, em disponibilidade e em abertura, características dos pobres.
Viver na fé em Jesus Cristo é sentirmo-nos escolhidos. É essa escolha primordial que nos liberta para a aventura de viver. Esta certeza de um reconhecimento que antecede e está para além dos nossos merecimentos funda-nos na confiança, condição de liberdade e de perdão.
Descobrimos que a fé em Jesus ultrapassa o religioso - o que importa para Jesus é o homem novo que está em cada um de nós e se revela no viver. A experiência de fé situa-se na pertinência e no sentido do vivido e não pode, por isso, reduzir-se a um conjunto de práticas que, sendo ordenadoras, excluem os menos conformes. A proposta da fé integra e inclui a partir do essencial – Jesus Cristo que nos seus gestos e palavras sempre amou e incitou ao amor.
Olhamos para o mundo como lugar de manifestação e presença de Deus, lugar de realização do homem e da mulher. Um mundo ainda fragmentado e incerto, tão esquivo à nossa ânsia de explicação, um mundo onde tantas urgências de recomposição e de religamento pedem disponibilidade, inteligência e dedicação. Hesitamos porque queremos tudo saber antecipadamente, controlar os processos e os resultados. E, no entanto, as ruas das cidades, as escolas, os hospitais, os media, as igrejas aí estão a solicitar criatividade, acção consequente para que a vida seja mais suportável para tanta gente que precisa de se sentir acolhida e reconhecida na sua dignidade. Esta preocupação passa pelo envolvimento na actividade profissional, que não esgota a dimensão da intervenção social e política.
Assumindo-nos como expressão de Igreja, temos consciência de que somos uma experiência construída na fragilidade, que bebe da água da sabedoria de tantos homens e mulheres que viveram na busca de Deus e deram sentido à paixão de Jesus. Não temos a pretensão de esgotar os diferentes níveis e modos de viver em comunidade; a nossa vivência eclesial, enquanto movimento, enriquece e é enriquecida pela nossa participação noutras instâncias e dimensões de vida em Igreja.
Sabemos, por experiência própria, que a Igreja se vive em comunidades que não são perfeitas, nem constituídas por pessoas perfeitas, mas pelos homens e pelas mulheres que aceitam o desafio de Jesus Cristo e lhe vão respondendo de diferentes maneiras, em dinâmicas de descoberta e de construção.
As formas organizativas do Metanoia procuram ser leves e flexíveis e assentam nos princípios da participação democrática, da corresponsabilidade, do voluntariado e da assunção colectiva dos encargos. É nosso propósito assegurar o auto-financiamento das nossas actividades, sem recorrer a apoios de que outros bem carecem. Os encontros, a publicação da revista Viragem, os meios electrónicos de comunicação, as coordenações locais e a nacional, são formas concretas de manter contactos, criar comunidade, fazer rede, partilhar reflexão, seja entre os associados do Metanoia, seja em círculos mais alargados da Igreja e da sociedade.
Participar no caminho, participar nos custos, participar nas decisões e no serviço à comunidade - eis a forma como procuramos viver esta outra faceta da nossa cidadania.
Aprovado na Assembleia do Movimento,
a 15 de Outubro de 2000, em Albergaria - a - Velha.
O que somos, o que queremos ser